Por
Carmen Migueles
O ano de 2015 promete
ser difícil e o desafio da produtividade tende a ser tratado de modo
superficial; as empresas brasileiras têm de enfrentar o verdadeiro problema: o
esgotamento da receita de gestão adotada.
Um dos maiores
revolucionários do século 20 é Frederick Taylor. Quando criou os princípios da
administração científica, aumentou 300 vezes a produtividade do trabalho humano
e inaugurou a era da produção em massa, gerando riqueza sem precedentes na
história da humanidade.
De 1911,
quando sua obra foi publicada, até hoje, muita coisa mudou, e assim esquecemos
a lição central: quando perdemos o foco na inteligência aplicada à gestão,
perdemos muito em produtividade.
Levanto o tema
aqui porque temo pela saúde das empresas e das pessoas dentro delas em 2015,
ano que promete ser difícil. Fala-se muito sobre a baixa produtividade do
trabalhador brasileiro, atribuindo-a a educação e a outros fatores fora do
controle dos gestores. Mas esquece-se de que a mão de obra inglesa ou a
norte-americana não eram mais educadas que a nossa em 1911, e ainda assim sua
produtividade foi às alturas.
Talvez
devêssemos olhar para dentro das empresas com mais cuidado. O que é valor para
as organizações brasileiras hoje? É redução de custos. O conceito de excelência
em gestão está ancorado em corte de custos fixos e em ganho financeiro de curto
prazo. De fato, na década de 1990, esse binômio gerou valor. Ali era possível
fazer mais com menos. Só que hoje estamos fazendo muito menos com menos.
Aplicamos a
mesma – e pouco sofisticada – receita de gestão há 25 anos. E o volume de
desorganização da gestão que conseguimos criar com isso é impressionante. Vemos
grandes quantidades de pessoas sobrecarregadas de tarefas competindo por tempo
escasso. Mas foi exatamente isso que Taylor provou que reduz produtividade. Os
gargalos organizacionais são enormes por falta de investimento e inteligência
em gestão. Há foco excessivo em cortes de custos, mas não costuma haver quem se
dedique a analisar o impacto sistêmico que esses cortes causam. Não a toa, na
maioria das empresas que visito, vejo processos rígidos, burocráticos,
controles distantes e centralizados e sem nenhum mecanismo de desenvolvimento
organizacional. Gestão do conhecimento, inovação e aprimoramento de processos
aparecem em discursos vagos, descolados da prática.
A busca de
resultado se dá por pressão e por comando e controle, o volume de conflitos
intraorganizacionais cresce muito e os gestores com menos escrúpulos tendem a
subir. Já quem tem coragem de apontar os problemas e propor soluções é
“desalinhado”, “resistente”.
Pune-se a
inteligência, cai o nível de confiança intraorganizacional, aumentam os custos
de transação e a percepção de risco internamente. Caem o comprometimento e a
predisposição a cooperar. A priorização do corte de custos fixos pune a busca
inteligente de eficiência e eficácia.
Qual o impacto
disso em desorganização, em retrabalho, em perda não mensurada de tempo e
esforço em obter recursos, em falta de suporte para a base de a organização
poder operar de modo eficaz, em má percepção pelo consumidor? Nossas pesquisas
indicam, por exemplo, que os consumidores – mesmo os da classe C – percebem uma
queda contínua de qualidade nos produtos e em atendimento.
Não podemos
entrar em 2015 querendo aumentar a produtividade só cobrando educação do
governo e usando o discurso da meritocracia e do senso de dono. Precisamos
repensar a gestão.
“NOS
ANOS 90 ERA POSSÍVEL FAZER MAIS COM MENOS, SÓ QUE HOJE FAZEMOS MUITO MENOS COM
MENOS”.
Carmen Migueles é Sócia-fundadora da Symballéin,
especializada em gestão de ativos intangíveis, e coordenadora do núcleo de
estudos de sustentabilidade em gestão da FGV.
Publicado
na revista HSMManagement nº 107, novembro/dezembro de 2014.