sexta-feira, 20 de junho de 2014

A GRANDE TRANSFORMAÇÃO



Por Pedro Luiz Passos

A gestão pública e privada é o que dá vida às inovações tecnológicas, viabilizando o crescimento e o bem-estar.

Com o país entretido entre Copa do Mundo, campanha eleitoral, incertezas da economia e baixo astral de noticiário, dá para entender a pouca atenção despertada por sinais de profundas transformações no mundo corporativo.
Elas dizem respeito ao papel crucial que a gestão empresarial desempenha não só na condução dos negócios, como na economia de modo geral. Sem criar modelos administrativos adequados, novas tecnologias não percorrem o caminho que separa uma boa ideia de um empreendimento de sucesso. Mais: a ausência de boas práticas gerenciais impede que avanços no cenário macroeconômico se transformem em ganhos de produtividade e expansão da atividade empresarial.
Enfim, tanto as conquistas tecnológicas como as melhorias macroeconômicas não vivem sem a excelência dos processos administrativos e, pior, se não houver elo que os una, eles se anulam mutuamente. Ainda sem ressonância no Brasil, o debate já se desenrola em outros países. Nos últimos anos falou-se na “grande estagnação”, como Tyler Cowen, professor da Universidade George Mason, dos EUA, titulou seu livro sobre o cenário econômico depois de 2008 – ou “estagnação secular”, como prefere o economista Paul Krugman.
Agora, em contrapartida, começa a surgir o que vem sendo chamada de a “grande transformação”. A transformação seria o resultado não só da inovação tecnológica, diz um dos seus teóricos, o presidente do Peter Drucker Society Europe, Richard Straub, mas, sobretudo, de avanços nos modelos de negócios, na gerencia das empresas e na gestão de governos. Ela se manifesta, em especial, no uso maciço de ferramentas digitais nas cadeias produtivas.
Essa evolução gerencial desponta como solução contra a estagnação das economias avançadas e pode se tornar um diferencial positivo para as emergentes. As bases para esse salto já existem, pois há inovação tecnológica suficiente para criar demandas de consumo e, portanto, desentocar o investimento empresarial.
A banda larga, por exemplo, viabilizou uma miríade de aplicativos para smartphones. Da mesma forma, o armazenamento remoto, ou “computação nas nuvens”, de quantidades gigantescas de informação sobre tudo e sobre todos – o que cria condições para outras inovações sejam de produtos, sejam de serviços. A maioria dessas tecnologias, a rigor, estava disponível há pelo menos uma década. Faltavam processos gerenciais e novos modelos de negócios para trazê-las ao mercado. Dessa forma, a administração desempenha na economia um papel semelhante à ação evolutiva das tecnologias de rupturas. A ideia central é a seguinte. A macroeconomia tem papel fundamental no crescimento. Por sua vez, as novas tecnologias permitem os avanços que moldam as relações econômicas e sociais. Mas é a administração tanto privada como pública que implanta as inovações e viabiliza a síntese entre crescimento econômico, resultado empresarial e bem-estar da sociedade.
Enfim, sem a gestão, não há progresso e tudo mais não se completa. “Se os gestores têm o poder de conduzir a economia para o buraco”, escreveu Straub em artigo da Harvard Business Review, “também têm poder de leva-la para frente”. Por isso, ideias e modelos que destravem o crescimento e elevem a qualidade do setor público são relevantes. Nos EUA, eles podem ajudar a acelerar a lenta recuperação econômica, assim como na Europa têm o potencial de contribuir para romper a estagnação da atividade industrial. Já na China ajudariam a dinamizar o crescimento pelo mercado interno. Tal agenda também é nossa, embora ignorada pela maioria dos protagonistas nos debates nacionais. Temos a vantagem de depender mais de nossos talentos gerenciais, que estão, em geral, em linha com o praticado nas grandes praças – basta ver o número de executivos brasileiros em postos de destaque em corporações internacionais. Essa agenda também demanda mais tecnologias de processos, em que não fazemos feio, que inovações na fronteira tecnológica, em que mal começamos a engatinhar. Obviamente, a consistência da macroeconomia é imprescindível para a sociedade realizar seus anseios. Sem ela, nem dará para cogitar as transformações que começam a moldar não só a economia, mas tudo o que a permeia, inclusive a noção de subdesenvolvimento.

Pedro Luiz Passos é Presidente do Iedi – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, e conselheiro da Natura.

Artigo publicado no jornal A Tarde (Salvador-Bahia) de 20/06/2014.

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